📝RESUMO DA MATÉRIA

  • O risco de gripe aumenta em 54% quando há privação aguda de sono, em especial em períodos com eventos nacionais que alteram os padrões de sono e enfraquecem as respostas do sistema imunológico.
  • O Dr. Matthew Walker, um dos maiores especialistas em sono da atualidade, destaca o sono como um alicerce fundamental para a saúde, influenciando a memória, a regulação emocional, a função imunológica e diminuindo o risco de doenças neurodegenerativas, como o Alzheimer.
  • O sono insuficiente gera consequências econômicas significativas, custando bilhões por ano às nações e impactando a produtividade, com cerca de um terço da população mundial não alcançando as horas de sono recomendadas.
  • A qualidade ideal do sono depende da adoção de horários consistentes, da criação de um ambiente escuro e fresco para dormir, do cuidado com a alimentação e do estabelecimento de rotinas noturnas relaxantes para apoiar a saúde celular.
  • Fatores relacionados ao estilo de vida, ao estresse, à tecnologia moderna e às predisposições genéticas contribuem para a perturbação do sono, tornando-o um elemento complexo, mas essencial para o bem-estar físico e mental geral.

🩺Por Dr. Mercola

A gripe é uma doença respiratória contagiosa caracterizada por sintomas como febre, tosse, dor de garganta, dores musculares e fadiga. Os Centros de Controle e Prevenção de Doenças dos Estados Unidos (CDC) estimam que a gripe provoque entre 9,3 e 41 milhões de casos por ano apenas no país.

Essa infecção viral pode causar complicações graves de saúde, em especial em populações vulneráveis, como idosos, crianças pequenas e indivíduos imunocomprometidos. Por isso, é essencial compreender os fatores que influenciam a propagação e a gravidade da gripe. Pesquisas recentes apontam que a privação de sono está associada de modo significativo ao aumento do risco de infecção.

A privação de sono aumenta o risco de contrair gripe

Um estudo recente publicado no medRxiv identificou que a privação aguda de sono está associada a um aumento de 54% no risco de consultas médicas relacionadas à gripe. Esse aumento expressivo evidencia o impacto dos padrões de sono na função imunológica e na suscetibilidade a doenças.

Os pesquisadores analisaram dados de usuários do Fitbit entre 2016 e 2022, estudando seus padrões de sono, a partir das estimativas fornecidas pelo dispositivo. Eles identificaram 32 eventos nacionais diferentes, tanto políticos quanto não políticos, durante os quais as pessoas estavam dormindo menos do que o habitual. Esses eventos foram chamados de eventos de privação aguda de sono.  Eles descobriram que, após a ocorrência desses eventos de privação aguda de sono, o risco dos participantes contraírem gripe aumentou de forma considerável.

“Em concordância com nossa hipótese, a associação entre os eventos de privação aguda de sono e as consultas relacionadas à gripe foi mais acentuada em indivíduos com maior número de genótipos de sono curto (OR = 1,47 [1,32, 1,64] vs. 1,10 [0,98, 1,22], valor de P da interação genótipo-evento de privação aguda de sono = 0,0008, Tabela S8-S10).
Juntas, essas descobertas sugerem que a privação aguda de sono em nível populacional, associada à predisposição genética, influencia de forma conjunta o risco de consultas médicas relacionadas à gripe", concluíram os pesquisadores. 4

Essa interação entre a privação de sono e o risco de gripe sugere que fatores que comprometem a qualidade do sono agravam a propagação e a gravidade da gripe, representando desafios adicionais para o controle e prevenção da doença.

A privação aguda de sono já configura uma emergência de saúde pública

O sono é essencial para a regulação de diversas funções do organismo, incluindo o funcionamento do sistema imunológico. Quando o sono é comprometido, há uma redução na produção de citocinas, proteínas responsáveis por auxiliar no combate às infecções. Essa redução enfraquece a resposta imunológica, tornando o organismo mais vulnerável a infecções como a gripe. Além disso, a privação de sono prejudica a produção de anticorpos pelo organismo, comprometendo ainda mais sua capacidade de combater infecções virais.

As causas subjacentes da privação aguda de sono são multifatoriais. Um dos principais fatores é o estilo de vida moderno, que muitas vezes prioriza a produtividade em detrimento do descanso. Essa pressão social contribui para a irregularidade dos padrões de sono e para a duração insuficiente do descanso.

Outro fator é o uso generalizado da tecnologia moderna, que expõe os indivíduos à luz azul das telas, alterando os ciclos naturais do sono. O estresse e a ansiedade, comuns no ritmo acelerado da vida atual, agravam ainda mais as alterações no sono. As predisposições genéticas também exercem uma influência significativa, pois certos indivíduos têm uma tendência natural a dormir menos, tornando-os mais vulneráveis às consequências da privação de sono.

A complexidade do sono e seu impacto na saúde fazem com que, por vezes, o diagnóstico seja insuficiente. Muitos profissionais de saúde não reconhecem por completo a importância dos padrões de sono em relação aos desfechos de saúde. Essa negligência resulta em subdiagnósticos ou diagnósticos incorretos de condições relacionadas à privação de sono.

Sono: o restaurador fundamental para o bom funcionamento do seu cérebro e corpo

O vídeo em destaque do podcast The Diary of a CEO apresenta o Dr. Matthew Walker, professor de neurociência e psicologia da Universidade da Califórnia, em Berkeley, e um dos maiores especialistas em ciência do sono da atualidade. Nesta entrevista, Walker compartilha ideias valiosas que ajudarão a revolucionar sua compreensão sobre o sono.

"Dormir é a ação isolada mais eficaz que você pode adotar para restaurar a saúde do seu cérebro e do seu corpo. O sono é seu sistema de suporte à vida e, pelo que podemos perceber, eu diria que é o melhor esforço da Mãe Natureza até agora rumo à imortalidade”, afirma ele.

A importância evolutiva do sono não pode ser subestimada. Walker explica que o sono evoluiu junto com a própria vida neste planeta, o que evidencia seu papel fundamental nos processos biológicos. Essa presença constante ao longo da história natural reforça a função essencial do sono na manutenção da vida e no suporte ao crescimento.

Walker afirma que a privação de sono na atualidade representa um fardo econômico alarmante, custando bilhões de dólares por ano à maioria das nações. Esse impacto financeiro expressivo destaca a importância de priorizar o sono adequado tanto nas estratégias de saúde pública quanto nas escolhas individuais de estilo de vida.

"A privação de sono custa à maioria dos países cerca de 2% do seu [Produto Interno Bruto] PIB. Nos Estados Unidos, esse valor chegou a 411 bilhões de dólares em lucros perdidos causados pelo sono insuficiente. No Reino Unido, ultrapassou os 50 bilhões de dólares. No Japão, mais de 120 bilhões de dólares".

O sono desempenha um papel multifacetado na sua saúde

Walker descreve o sono como "a maré que impulsiona todos os outros barcos da saúde". Ao sustentar diversas funções do organismo, desde o metabolismo até a regulação emocional, o sono garante que todos os aspectos da sua saúde sejam mantidos de forma ideal, tornando-se um pilar fundamental da saúde geral e da longevidade.

No entanto, ele estima que um terço da população mundial não atinge as 7 a 9 horas de sono recomendadas por noite, o que desencadeia uma série de problemas de saúde que comprometem o bem-estar geral.

Por exemplo, o sono exerce um papel crucial no fortalecimento do seu sistema imunológico, ajudando o organismo a se defender melhor contra doenças e a se recuperar com maior rapidez quando adoece. "O sono, por exemplo, reabastecerá as armas do seu arsenal imunológico. Isso fará de você um indivíduo com maior sensibilidade imunológica, de modo que sua imunidade ficará mais fortalecida ao acordar", explica Walker.

Quando se trata de controle de peso, não dormir o suficiente tem consequências significativas. Walker observa que, se você não dormir o suficiente, 60% de toda a perda de peso virá da massa muscular magra e não da gordura. Isso significa que a falta de sono não só prejudica a sua capacidade de perder os quilos indesejados, mas também compromete sua força muscular e seu metabolismo geral.

"Quando você está fazendo dieta, mas dorme pouco, você perde o que gostaria de manter, que é músculo, e mantém o que gostaria de perder, que é gordura. Ou seja, mais uma vez, não é uma situação ideal", conclui.

O papel do sono de alta qualidade na saúde do cérebro e na doença de Alzheimer

Walker também abordou os efeitos da privação do sono na saúde cognitiva e emocional, destacando que a memória e a capacidade de aprendizado possuem uma ligação profunda com os padrões de sono. "Durante o sono, o cérebro consolida memórias e ajuda você a aprender e a lembrar", afirma. 

Conhecimento e sabedoria estão profundamente conectados por meio do sono. Enquanto  o conhecimento envolve a retenção de informações isoladas, a sabedoria consiste em compreender como essas informações se conectam entre si. 12 O sono facilita essa transformação, permitindo que você integre e aplique o que foi aprendido de forma significativa.

O bem-estar emocional também é muito influenciado pela qualidade do seu sono. Um sono adequado ajuda a reduzir a ansiedade e atenuar dificuldades e traumas emocionais. Ao permitir que o cérebro processe emoções de forma eficaz, o sono contribui para a estabilidade mental e aumenta a resiliência diante de situações estressantes.

No campo das doenças neurodegenerativas, Walker afirma que o sono exerce um papel notável de limpeza no cérebro, auxiliando na remoção de proteínas tóxicas associadas à doença de Alzheimer. Esse processo de desintoxicação é fundamental para prevenir o aparecimento e a progressão de condições relacionadas à demência, destacando o papel do sono na preservação da saúde cerebral a longo prazo.

"As duas doenças mais temidas nos países desenvolvidos são o câncer e a doença de Alzheimer. Ambas estão associadas ao sono insuficiente, sendo que, em muitos casos, essa relação é de natureza causal. No que diz respeito à relação entre sono e doença de Alzheimer, diria que cerca de 50% do trabalho realizado em meu centro de sono é dedicado a essa condição.
Os dados são impressionantes. Neste momento, o sono insuficiente parece ser um dos fatores de estilo de vida mais relevantes para o desenvolvimento da doença de Alzheimer no decorrer da vida. Estamos falando de um fator de estilo de vida. Existem outros fatores genéticos, mas com certeza sabemos que a falta de sono prevê uma maior carga de patologia de Alzheimer no cérebro".

Estas estratégias irão otimizar a qualidade do seu sono

A falta de sono prejudica todos os aspectos da sua saúde, desde o seu desempenho cognitivo até a resiliência do seu sistema imunológico. Por sorte, modificações no estilo de vida, alinhadas à produção ideal de energia celular e ao bem-estar geral, ajudarão a melhorar de maneira significativa a qualidade do seu sono.

Uma das recomendações de Walker é evitar permanecer na cama pela manhã. Dentro de 30 minutos após acordar, você deve sair da cama, ir para outro cômodo e fazer algo relaxante, como alongar-se, meditar ou até mesmo ler um livro.

"O motivo é que se você começar a passar muito tempo acordado na cama, seu cérebro, por ser um órgão associativo, logo aprenderá que esse lugar chamado cama é onde você está sempre acordado.  Assim, por meio de um ciclo repetitivo, você associa a ideia de que 'eu estarei sempre desperto na cama', e é preciso quebrar essa associação”, explica ele.

Uma das estratégias que recomendo é obter pelo menos 10 a 15 minutos de exposição à luz natural logo ao despertar. A luz do sol da manhã, intensa e rica em luz azul, sinaliza ao seu corpo que é hora de acordar. Isso envia uma mensagem importante  ao seu relógio biológico, indicando o início do dia e reduzindo a probabilidade de confusão ao longo do dia, causada por sinais luminosos mais fracos.

Para uma rotina de sono eficiente, a consistência é fundamental. Recomendo a leitura do artigo "33 principais dicas para otimizar sua rotina de sono" para uma lista abrangente de estratégias para obter um sono reparador e de alta qualidade à noite. Mas para começar, siga estas quatro dicas:

1. Mantenha um horário de sono consistente: Estabelecer horários regulares para dormir e acordar todos os dias ajuda a sincronizar seu ritmo circadiano de forma natural. Padrões de sono consistentes permitem que seu corpo se prepare para o descanso de forma mais eficiente, promovendo um sono mais profundo e restaurador.

Procure ter de 7 a 9 horas ininterruptas de sono por noite. A privação crônica do sono ou dormir menos de 6 horas repetidas vezes aumenta de forma substancial o risco de acidentes, de comprometimento do processo de tomada de decisões e de diversas outras complicações de saúde.

2. Otimize seu ambiente de sono para a saúde celular: Crie um ambiente escuro, silencioso e fresco, mantendo a temperatura entre 18°C e 20°C. Isso auxilia na queda natural da temperatura corporal, o que facilita o sono reparador.

Elimine todas as fontes de luz artificial, incluindo telas de LED e dispositivos eletrônicos, pois até mesmo a exposição mínima à luz inibe a produção de melatonina e interfere no seu ciclo natural de sono.

Além disso, certifique-se de manter o local livre de toxinas ambientais, evitando o uso de produtos que contenham óleos vegetais, metais pesados ou outras substâncias nocivas. Opte por roupas de cama naturais não tóxicas e minimize a exposição à poluentes para promover um ambiente favorável ao funcionamento celular ideal e à qualidade do sono.

3. Regule a ingestão de carboidratos e proteínas para um sono restaurador: Sua dieta desempenha um papel fundamental na qualidade do sono. Consuma de 250 a 300 gramas de carboidratos por dia, ajustando essa quantidade de acordo com seu nível de atividade e composição do seu microbioma, com o objetivo de apoiar a produção de energia celular e a saúde metabólica.

Certifique-se de que cerca de 15% da sua ingestão de calorias provenha de proteínas, priorizando a ingestão de 1,76 gramas de proteína por quilo de massa magra. Inclua fontes de proteína ricas em colágeno para favorecer processos metabólicos e contribuir para a saúde integral do organismo. Evite dietas ricas em fibras e elimine alimentos como laticínios pasteurizados, salgadinhos industrializados e alimentos ultraprocessados.

Essa abordagem ajuda a preservar a saúde intestinal e reduz os níveis de endotoxinas, impactando de maneira positiva a qualidade de seu sono.

4. Apoie a função mitocondrial com suplementos: Desenvolva uma rotina noturna relaxante 2 a 3 horas antes de dormir, reduzindo atividades físicas e cognitivas. Inclua práticas relaxantes, como alongamentos leves, leitura ou movimentos suaves, para sinalizar ao seu corpo que é hora de se preparar para o descanso. Evite atividades estimulantes, refeições pesadas e exercícios intensos nesse período.

Considere a inclusão de azul de metileno de grau farmacêutico, apenas com a prescrição de um profissional de saúde, para apoiar a função mitocondrial e atenuar o estresse redutivo. A dosagem recomendada é de 5 miligramas uma vez ao dia, adquirida em farmácias de manipulação.

Além disso, considere práticas de aterramento em ambientes não contaminados, como o mar, para aliviar o estresse e promover relaxamento. Esta rotina estruturada de relaxamento ajuda a conduzir o cérebro de um estado ativo para um estado de descanso, promovendo um sono de maior qualidade e mais restaurador.