📝RESUMO DA MATÉRIA
- Cada vez mais meninas estão tendo a primeira menstruação em idades mais jovens e demorando mais para ter um ciclo menstrual regular, conforme destacado em um estudo de maio de 2024 publicado no JAMA Network Open. Menstruações precoces e irregulares têm sido associadas há muito tempo a efeitos prejudiciais à saúde.
- A menstruação precoce pode ser influenciada por origens socioeconômicas, alto índice de massa corporal durante a infância, baixos níveis de atividade física e tempo de uso de eletrônicos.
- Ter ciclos irregulares prolongados resulta em uma exposição prolongada a um desequilíbrio entre estrogênio e progesterona, o que pode aumentar o risco de câncer do endométrio e problemas de fertilidade.
- Outro possível fator por trás da puberdade precoce em meninas é a exposição a compostos estrogênicos. Aqui estão dicas para ajudar a diminuir a carga de estrogênio da sua filha.
🩺Por Dr. Mercola
A puberdade é um importante período de desenvolvimento que marca a transição entre a infância e a idade adulta, caracterizado por significativas mudanças físicas, emocionais, psicológicas e sociais. Para as meninas, um dos marcos mais notáveis da puberdade é o início da menstruação (menarca), que em última análise leva à maturidade reprodutiva.
Tradicionalmente, a idade média da menarca é entre 12 e 15 anos. No entanto, uma tendência preocupante surgiu nas últimas décadas nos EUA e em todo o mundo: cada vez mais meninas têm a sua primeira menstruação em idades mais jovens. Esta mudança para a menarca precoce não é apenas um pequeno desvio da norma. Ela também poderia sinalizar problemas de saúde mais tarde na vida, conforme destacado em um estudo de maio de 2024 publicado no JAMA Network Open.
As gerações mais jovens estão menstruando mais cedo do que nunca
O estudo de maio de 2024 do JAMA Network Open está entre muitos que ressaltam a crescente incidência e implicações da menarca precoce, definida como menstruação antes dos 11 anos. Os pesquisadores analisaram dados de 71.341 mulheres participantes nos EUA, nascidas entre 1950 e 2005, que responderam questionários para o Apple Women's Health Study, uma iniciativa de pesquisa de longo prazo que visa examinar os ciclos menstruais usando dados coletados do aplicativo de celular Apple Health.
Além de analisar a idade em que as participantes tiveram a menarca, os investigadores também consideraram quanto tempo demorou para os seus ciclos menstruais se tornarem regulares, acompanhando essas tendências em diferentes grupos demográficos. As suas descobertas revelaram que a idade média da menarca diminuiu de 12,5 anos (para as nascidas entre 1950 e 1969) para 11,9 anos (para as nascidas entre 2000 e 2005).
É alarmante que a porcentagem de meninas que sofrem de menarca precoce aumentou de 8,6% para 15,5%, e a menarca muito precoce (antes dos 9 anos) de 0,6% para 1,4%. A porcentagem de meninas que atingem a regularidade do ciclo menstrual em dois anos também caiu de 76,3% para 56,0%, enquanto aquelas com ciclos irregulares aumentaram de 3,4% para 18,9%.
Os pesquisadores observaram que "apesar da magnitude pequena da mudança na idade média, o nosso estudo está entre os primeiros a mostrar que as porcentagens de menarca precoce e muito precoce também aumentaram quase o dobro ao longo dos anos de nascimento de 1950 a 2005, levantando preocupações de que mais indivíduos possam estar vulneráveis a resultados adversos para a saúde relacionados à menarca precoce".
Eles enfatizaram também que essas tendências são mais evidentes entre as mulheres pertencentes a minorias raciais e étnicas, incluindo indivíduos não negros hispânicos, asiáticos e multirraciais, além daqueles de origens socioeconômicas mais baixas. Além disso, o índice de massa corporal (IMC) é responsável por cerca de 46% da tendência para a menarca mais precoce, indicando que as taxas crescentes de obesidade infantil desempenham um papel, mas não são o único fator.
“Isso é importante porque a menarca precoce eea menstruação irregular podem sinalizar problemas físicos e psicossociais mais tarde na vida, e essas tendências podem contribuir para o aumento de resultados adversos de saúde e disparidades nos EUA”, afirmou o Dr. Zifan Wang, principal autor do estudo e pesquisador pós-doutorado na T.H. Chan School of Public Health da Universidade de Harvard, à CNN.
Outros fatores de estilo de vida que influenciam o início da menstruação
Em um estudo caso-controle publicado na Scientific Reports, os pesquisadores investigaram o impacto coletivo do tempo de tela em eletrônicos, atividade física moderada a intensa e sobrepeso/obesidade no desenvolvimento puberal precoce em meninas. Eles examinaram dados de 177 meninas recém-diagnosticadas com puberdade precoce e 354 meninas com desenvolvimento normal na China.
A análise revelou uma associação significativa entre a presença de dois fatores de risco e a probabilidade de puberdade precoce. O alto tempo de tela associado à baixa atividade física se correlacionou com um aumento de 13 vezes no risco. O alto tempo de tela combinado com sobrepeso ou obesidade resultou em um risco 6,5 vezes maior. Enquanto isso, a baixa atividade combinada com sobrepeso ou obesidade resultou em um risco seis vezes maior.
As meninas que apresentam todos os três fatores de risco têm um risco 26 vezes maior de puberdade precoce. Com base nessas descobertas, os autores destacaram a importância de manter um estilo de vida saudável para os adolescentes:
“Recomendamos que as meninas não passem seu tempo livre assistindo TV ou em outras telas eletrônicas, evitem um estilo de vida sedentário, que é caracterizado por baixa AFMI [atividade física moderada a intensa] e alto EST [tempo de tela eletrônica]. Em vez disso, elas devem gastar mais tempo se exercitando, por razões relacionadas à obesidade e também à potencial puberdade precoce, mesmo em meninas com peso normal”.
‘A menstruação é como um sinal vital’
A Dra. Eve Feinberg, professora associada de obstetrícia e ginecologia da Faculdade de Medicina Feinberg da Northwestern University, em Chicago, comparou a menstruação a um sinal vital. “Você quer ter certeza de que o corpo esteja regulado. E quando os ciclos não são regulares, no geral é um sinal de que algo mais pode estar acontecendo", disse ela à CNN. Menstruações precoces e irregulares têm sido associadas há muito tempo a efeitos prejudiciais à saúde. De acordo com o estudo do JAMA Network Open:
"A menarca precoce está associada a um risco aumentado de resultados adversos para a saúde, tais como doenças cardiovasculares, cânceres, aborto espontâneo e morte prematura... A maturação do eixo reprodutivo, medida pelo tempo desde a menarca até à regularidade do ciclo menstrual, é outro marco importante, mas pouco estudado da saúde menstrual na infância…
A maturação completa do eixo reprodutivo resulta em uma função menstrual mais regular. Um tempo mais longo para a regularidade menstrual tem sido associado a menor fecundabilidade, ciclos menstruais mais longos e aumento do risco de condições metabólicas e mortalidade por todas as causas”.
Pesquisas também associaram a menarca precoce à obesidade, diabetes e problemas psicossociais como delinquência e comportamento social de risco. Além disso, Feinberg observou que ter ciclos irregulares prolongados resulta em uma exposição prolongada a um desequilíbrio entre estrogênio e progesterona, o que pode aumentar o risco de câncer do endométrio e problemas de fertilidade.
“O estrogênio sinaliza o crescimento, enquanto a progesterona indica que esse crescimento deve parar. Para prevenir doenças como o câncer uterino, você precisa dos sinais para iniciar e parar o crescimento”, explicou ela. Concordo com essa perspectiva e já há algum tempo que alerto sobre os perigos do excesso de estrogênio. Na minha opinião, o estrogênio é uma das duas principais razões para a maioria dos cânceres – a outra é o consumo excessivo de ácido linoleico.
Por que as pílulas anticoncepcionais não são uma boa ideia
No artigo da CNN, Feinberg sugeriu o uso de pílulas anticoncepcionais para controlar os ciclos menstruais. “Às vezes, até mesmo o uso de pílulas anticoncepcionais em idades mais jovens para ajudar a proporcionar uma exposição antecipada à progesterona… pode oferecer um pouco mais de controle do ciclo e talvez ser protetor”, disse ela.
Discordo de maneira respeitosa dessa recomendação porque, embora as pílulas anticoncepcionais tenham como objetivo imitar os efeitos da progesterona no corpo, elas também podem aumentar ainda mais os níveis de estrogênio, o que poderia causar mais danos do que benefícios.
Em geral, as pílulas anticoncepcionais contêm versões sintéticas de estrogênio e progesterona (progestina) ou apenas progestina. No entanto, a progestina não tem os mesmos efeitos fisiológicos que a progesterona endógena, sobretudo seus efeitos anti-estrogênicos. Na verdade, as progestinas tendem a diminuir e podem interromper por completo a produção endógena de progesterona, deixando o estrogênio sem oposição.
Muitas progestinas encontradas em pílulas anticoncepcionais, como noretinodrel e noretindrona, podem se ligar e ativar o receptor de estrogênio e são convertidas em estrogênios. A progesterona endógena não faz isso. Essa diferença fundamental destaca porque as pílulas anticoncepcionais podem não ser a solução ideal para regular os ciclos menstruais.
Sua filha está sendo exposta a compostos estrogênicos?
Compostos sintéticos com propriedades estrogênicas, conhecidos como disruptores endócrinos ou xenoestrogênios, estão presentes em vários produtos de consumo. Um artigo de janeiro de 2024 na Environmental Health Perspectives identificou 279 compostos estrogênicos fáceis de serem encontrados em produtos de consumo que induzem tumores mamários em animais. Eles também identificaram 642 produtos químicos com potencial de aumentar o risco de câncer de mama, estimulando a sinalização de estrogênio ou progesterona.
Uma das fontes mais difundidas de compostos estrogênicos são os plastificantes liberados pelos microplásticos no meio ambiente. De acordo com um estudo publicado na Nature Food, os bebês podem encontrar entre 14.600 e 4,5 milhões de partículas microplásticas por dia. Outro estudo sugere que as pessoas podem ingerir até 5 gramas de plástico por semana, o que equivale ao peso de um cartão de crédito.
Um artigo na revista Toxics investiga as repercussões da exposição precoce a compostos estrogênicos de microplásticos em crianças:
“[O] nível de hormônios sexuais na fase pré-púberal é mais baixo do que na fase puberal, porque o desenvolvimento neuroendócrino do eixo hipotálamo-hipófise-gonadal ainda é imaturo. Assim, os sistemas do corpo são muito suscetíveis aos efeitos dos produtos químicos desreguladores endócrinos (EDCs) de vários produtos à base de plástico durante esse sensível período de desenvolvimento.
Além disso, as crianças têm muito mais anos de vida do que os adultos; portanto, elas terão uma expectativa de vida mais longa para desenvolver doenças crônicas causadas pela exposição precoce”.
Apoiando essas descobertas, um estudo sugeriu que a exposição ao bisfenol A (BPA) poderia levar a sinais precoces de puberdade, como o desenvolvimento prematuro dos tecidos mamários (telarca) em crianças de 2 meses a 4 anos de idade. Outros tipos de DEs também estão associados à puberdade precoce. Por exemplo, um estudo descobriu que os bifenilos polibromados (PBBs) causaram menarca precoce em meninas expostas a esse produto químico no útero.
Os PBBs são um grupo de produtos químicos sintéticos usados como retardantes de chama e conhecidos por suas propriedades estrogênicas. Isso enfatiza a necessidade de mais pesquisas sobre o papel das substâncias semelhantes ao estrogênio no desenvolvimento puberal e a importância de proteger as crianças de todas as fontes de compostos estrogênicos.
Estratégias de proteção contra a carga excessiva de estrogênio
Para ajudar a controlar a exposição estrogênica e mitigar qualquer impacto da menstruação precoce na sua filha, recomendo seguir estas estratégias de bom senso:
🔍Recursos e Referências
- Cleveland Clinic, Adolescent Development
- J Pediatr Adolesc Gynecol. 2016 Dec;29(6):527-530
- JAMA Netw Open. 2024;7(5):e2412854
- CNN, May 30, 2024
- Scientific Reports Volume 14, Article number: 10541 (2024)
- Korean J Pediatr. 2016 Sep; 59(9): 355–361
- Environmental Health Perspectives January 10, 2024; 132(1)
- Nat Food. 2020 Nov;1(11):746-754
- University of Newscastle June 12, 2019
- Toxics. 2022 Oct; 10(10): 597
- Int J Environ Res Public Health. 2017 Sep; 14(9): 1044
- Epidemiology. 2000 Nov;11(6):641-7